domingo, 15 de julho de 2007

Prosopopéia das leis: a despedida da lei penal

A prosopopéia das leis: a despedida da lei penal
Juliana Goulart

Cansada de se sentir acusada pelo povo do planeta Titanius, de ser a causadora das injustiças e crimes que ocorriam naquele território, a lei penal decidiu ir embora.

Estava cansada de tudo e de todos, pois ninguém a via da forma como ela realmente era e a julgavam apenas por sua aparência. De acordo com alguns, ela era inválida; para outros ela era ineficaz; enquanto outros a acusavam de inexistente! Quando caminhava pelas ruas, sentia a rejeição e frieza das pessoas que a observavam e muitas vezes tinha que fugir, pois era seguidamente perseguida. Nos Fóruns e Tribunais, ainda tinha que agüentar algumas pessoas colocando na sua boca coisas que ela jamais havia dito e distorcendo o que ela jamais havia imaginado. A pobre lei era digna de pena. Não cuidava mais nem de sua aparência e saúde. Além de tudo, não se sentia amada. O que mais doía era que recentemente tinha se separado do seu marido, o Direito Constitucional, que rompeu com ela, apesar de amá-la, pois não agüentava a situação constrangedora de ter sua relação afetiva estampando a capa de milhares de jornais, revistas e livros. E também corria um boato que o marido estava “constitucionalizando” a lei civil, o que aborrecia demais a pobre lei penal. Como estava muito carente, acabou tendo um surto de ciúme que, enfim, fez sua relação com o marido afundar.

Era comum, em momentos de crise, ela sair para ver o mar. Enquanto contemplava a natureza, derretia-se em lágrimas pensando em alguma solução para mudar o seu triste destino. O que poderia ela fazer?

A pobrezinha tinha apenas alguns instantes de felicidade, quando era notificada que algum trabalho de sua competência tinha sido excluído. Nessas horas, ela sentia um grande alívio. “Que destino mais pesado esse o meu”, ela pensava. “Quando também não é sangrento!”. Estava cansada de furtos, homicídios, colarinhos brancos, tráficos, estupros. Que triste ofício ela tinha: conviver com todos esses delitos. Ela não achava que tinha afinidade com essas coisas todas e sonhava que poderia mudar sua reputação. Mas como? Isso tudo fazia parte de sua angústia e ela não via luz no fim do túnel, nem mesmo depois de anos de terapia com a inteligente Psicologia Criminal.


Não tendo outra escolha naquele planeta, decidiu então recomeçar sua vida em um outro lugar. Mas será que sentiriam sua falta? Decidiu mudar de vez sua vida e arrumar as coisas para partir. Mas o que faria para sobreviver? Lembrou que perto dali, num planeta próximo, chamado Sophia, pessoas que se sentiam infelizes e tinham tristes ofícios poderiam lá reconstruir suas vidas. E logo arrumou uma vaga de emprego por lá como plantadora de flores. “Conviver com o perfume das flores, sentir o vento bater no meu rosto, quanta liberdade”! Hoje ela vive lá e se acha feliz. Tem trocado correspondência virtual com seu ex, o Direito Constitucional. É que além de ter tido alguns aborrecimentos e desilusões, ele sente muita saudade da sua amorosa ex. E já faz planos para se mudar e ficar pertinho de seu grande amor.Quando? Ele pensa em se mudar no semestre que vem, para jogar de atacante no time de vôlei do planeta Sophia.

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